terça-feira, 1 de novembro de 2016

Poesia Confessional

Esmagada novamente me desperto.

Tropega.

Desorientada de mim e sozinha fazem séculos,
No susto e com o respiro me levanto.
Procuro as chaves. 
Saio ainda bêbada pela Rua da Feira.
Pensando que não tenho pra quem ligar.
Nem tenho celular.
E depois de tudo.
Depois de tantos e tantas.
Porquê ficar?
"Você pode ir ao inferno minha filha, mas seu Santo tá aqui!"
Não achei as compras de ontem.
Os cachorros já não comem como antes.
Porquê ficar?
"Veja bem, quando ele está, não fica bem você beber na rua. Parece que você está atrás dele. Pra uma mulher não pega bem."
Não há Moto-táxi em frente à Faculdade.
Deve ser cedo pela neblina.
O cheiro da cidade é sem igual.
Porquê ficar?
"Não acredito que ele deixou você!"
Moro longe, tenho fome.
Tive pesadelos com os olhos de Odé. 
Porquê ficar?
"Ele te comeu para destilar uma mágoa"

Acho um carreto que me cobra 30 reais, sendo que sei que custa vintão.
Tenho que levar o pássaro azul...
Não tem jeito.
Porquê ficar?
"O preço da gasolina tá caro dona" (principalmente para as que tem cara de polonesa)
Agora sim, sei que é luta ser negro.
Agora sim sei que nunca fomos um país inteiro.
É cedo, é cedo!
Pessoas com roupa de ginástica a caminhar.
Sol e sorrisos.
Tudo que eu sinceramente acho sinistro.
Porquê ficar?
"Aquela Francine é mesmo barril, tinham três garrafas de champanhe lá..."
E não reverbero mais nada do que meu Axé...
Penso no caos da casa.
Sinto amor por meus cachorros e meu cavalo.
Rita e Raul também.
Chego com a grama molhada.
O céu, o sol, a sifonia mais perfeita a tocar.
Pássaros, pássaros, pássaros.
Sinto falta de Antônio, meu amoroso pai.
Ele lá na desgraça de São Paulo.
Choro por não conseguir imaginar que ele pode nunca mais me enxergar.
Choro por Alegria jogado na poeira e por Zoreia, morrendo na rua.
Não há compaixão em nenhuma esquina.
Somente os Orixás Mensageiros fartos e sorridentes de tanto comer do "querer" de muitos.
Porquê ficar?
Tomo o Rivotril que me deram...
Aquele de antes.
Porquê ficar?
Só existe o fascinante canibalismo da matéria.
O futuro é apenas a possibilidade.
A Existência pertence ao presente.
Porquê ficar?
Tenho de tudo, menos o Medo.
Não sou Muralha, sou um Oceano.
Adaptação.
Ora líquida, ora sólida, ora ar.
Levantar e Ser todos os dias.
Isso me faz ficar.

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